A ATRAÇÃO DE PROFISSIONAIS DO MERCADO PARA COMPARTILHAR EXPERIÊNCIAS EM SALA DE AULA - Gustavo Fagundes - ABMES
Na edição da revista Época do último dia 17.11.2014, em artigo intitulado “A universidade burra”, Walcyr Carrasco menciona o desinteresse das universidades em atrair profissionais do mercado para o compartilhamento de experiências nas salas de aula.
O texto pode ser lido e interpretado sob diversos prismas, mas é certo que a primeira impressão que temos é que o autor do referido texto estaria defendendo uma utilização mais expressiva de profissionais do mercado como docentes nas instituições de ensino superior, como forma de proporcionar oportunidades de compartilhamento de experiências.
Sob qualquer prisma que se interprete o texto, não há como negar que a participação destes profissionais no processo educacional é mais do que necessária, haja vista a necessidade de uma efetiva interface entre o ambiente acadêmico e o mercado profissional, até porque uma das finalidades essenciais da educação é a preparação do educando para o trabalho.
Infelizmente, essa interação não é tão simples como se poderia supor, porquanto, apesar de existir indicador de qualidade destinado, especificamente, a aferir a “experiência profissional do corpo docente” dos cursos superiores, como contido no indicado 2.10 do Instrumento de Avaliação de Cursos de Graduação presencial e a distancia, existem outros dois indicadores exclusivamente destinados à aferição da titulação, quais sejam, os indicadores 2.8 (“Titulação do corpo docente do curso”) e 2.9 (“Titulação do corpo docente do curso – percentual de doutores”).
Além disso, não basta que o profissional de mercado, para atuar como docente na educação superior, possua, no mínimo, título especialista, obtido em curso de pós graduação lato sensu, em atendimento ao disposto no artigo 66 da LDB, que assim dispõe, verbis:
“Art. 66. A preparação para o exercício do magistério superior
far-se-á em nível de pós-graduação, prioritariamente em programas de
mestrado e doutorado.”
Desse modo, para que o profissional em comento esteja devidamente
habilitado para atuação como docente, precisa ser, pelo menos,
especialista, para que, atendendo ao dispositivo legal acima, seja
atendido ao requisito legal e normativo pertinente.Contudo, os problemas não param por aí!
A própria sistemática de avaliação e, sobretudo, a atividade de regulação exercida pela SERES/MEC a partir dos resultados dos procedimentos avaliativos é obstáculo à melhor interação entre os profissionais de mercado e as instituições de educação superior.
Com efeito, para apuração do indicador de qualidade denominado CPC – Conceito Preliminar de Curso - são utilizados alguns insumos extraídos das informações prestadas pelas instituições ao preencherem o Censo da Educação Superior.
Entre esses insumos, certamente exercem grande influência sobre a apuração do referido indicador os dados relativos à titulação do corpo docente, especialmente a quantidade de doutores alocados em cada curso.
Por outro lado, não há sequer o lançamento de informação relativa à existência dos chamados profissionais de mercado no corpo docente dos cursos superiores, muito menos a utilização desse dado como informação destinada ao cálculo do prefalado indicador de qualidade.
Vale dizer, o Ministério da Educação simplesmente considera desprezível a importância desses profissionais no processo de ensino-aprendizagem, desconsiderando a relevância de sua participação como forma de garantir a qualidade dos cursos superiores.
Esta constatação ganha relevância quando constatamos o uso dos indicadores de qualidade dos cursos superiores (CPC – Conceito Preliminar de Curso) e das instituições de ensino superior (IGC – Índice Geral de Cursos Avaliados) como ferramentas de regulação e, sobretudo, de imposição de sanções administrativas como a redução de vagas ou a suspensão de processos seletivos, em manifesta desconformidade com os princípios do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior – SINAES, claramente lançados na Lei nº 10.861/2004.
Podemos verificar, portanto, que o desestímulo à intensificação da utilização dos profissionais do mercado para o compartilhamento de suas experiências no ambiente da sala de aula, na realidade, não é um fenômeno decorrente da postura adotada pelas instituições de ensino superior.
É, na verdade, uma decorrência da concepção de qualidade imposta pelo Ministério da Educação, que notadamente privilegia a titulação em programas de pós graduação stricto sensu, em detrimento de uma efetiva interação entre as instituições de ensino superior, seus cursos e o mercado profissional, à medida que relega ao segundo plano as possibilidades de compartilhamento de experiência profissional no processo de ensino-aprendizagem.
Destarte, o alegado “desinteresse” criticado no artigo mencionado no início desse texto nada mais é do que uma reação ao contexto avaliativo e, sobretudo, regulatório, imposto pelo Ministério da Educação.
Por outro lado, e encerrando esse texto buscando apontar possibilidades de utilização da imprescindível experiência dos profissionais de mercado, cumpre apenas registrar que não é obrigatório que as instituições de ensino superior utilizem esses profissionais exclusivamente sob a forma de atuação docente, podendo, decerto, estar presentes como palestrantes e convidados nos mais diversos tipos de atividades integrantes da figura do trabalho acadêmico efetivo
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