Carne vermelha, bactérias intestinais e doença cardíaca
Um novo ingrediente foi adicionado à polemica
sobre o efeito da ingestão excessiva de carne vermelha sobre a saúde do
coração. Após décadas da culpa dos danos cardíacos recair sobre as
gorduras saturadas e o colesterol contidos na carne vermelha, uma
recente análise de vários estudos epidemiológicos mostrou que não há
evidência científica suficiente para atribuir à gordura na dieta o
aumento do risco para doença cardíaca. Isto reforça uma suspeita de que o
conteúdo de colesterol e gordura saturada da carne vermelha não é o
suficiente para explicar a associação existente entre doença cardíaca e o
consumo de carne vermelha. Um novo personagem entrou em cena e talvez
venha a resolver a polêmica.
Resultados de um estudo publicado online na
revista científica Nature Medicine, no dia sete de abril, indicam que
comer grande quantidade de carne vermelha, mesmo magra (com pouca
gordura saturada e colesterol), pode causar doença cardíaca devido ao
desenvolvimento de aterosclerose (confirmando a associação entre
ingestão de carne vermelha e doença cardíaca).
Pesquisadores da Clinica Cleveland, nos Estados
Unidos, demonstram no trabalho que um tipo de bactéria do intestino
transforma o composto L-carnitina em outro, o óxido de N-trimetilamina
(TMAO). Estudos prévios do mesmo grupo de investigadores já tinham
mostrado que a TMAO promove aterosclerose em humanos.
A L-carnitina está presente em quantidades
apreciáveis em carnes vermelhas (gordas e magras) e também em derivados
do leite (na fração whey), em bebidas energéticas e suplementos
esportivos, assim como, em menor quantidade, em carnes brancas. Esta
substância não é por si só tóxica ou aterogênica. Pelo contrário, ela
desempenha papel fundamental no metabolismo de todas as células e é
produzida pelo organismo em quantidades suficientes para cumprir suas
funções, não sendo necessária a sua ingestão. O problema é que, quando
ingerida, no intestino ela favorece o desenvolvimento da bactéria que a
transforma em TMAO, esta sim a substância vilã da história, que vai
produzir a aterosclerose e a consequente doença cardiovascular.
O experimento utilizou voluntários que
habitualmente se alimentam de carne e laticínios e de vegetarianos (não
comem carne) e veganos (não comem alimentos de origem animal, incluindo
ovos e derivados do leite). Os testes demonstraram que nos habituados a
ingerir carne e laticínios, a administração de L-carnitina elevou as
concentrações plasmáticas de TMAO, ao passo que nos veganos e
vegetarianos esse aumento foi significativamente menor.
Exames nas fezes demonstraram que há uma grande
diferença nos tipos de bactérias presentes no trato intestinal dos
indivíduos que se alimentam de carne, quando comparados com veganos e
vegetarianos. O estudo foi ampliado com a dosagem de L-carnitina e TMAO
no sangue de 2595 pessoas. O resultado mostrou que as que tinham um
aumento dos dois componentes apresentaram maior risco para doenças
cardiovasculares, e que os que tinham aumento somente da L-carnitina,
não apresentavam o mesmo risco.
Este conjunto de evidências remete a questão da
carne vermelha (e de todos os alimentos e suplementos que possuem
quantidades apreciáveis de L-carnitina) às bactérias intestinais.
Convenhamos, esta é uma mudança bastante radical de paradigma,
considerando o conjunto de diretrizes de saúde mundiais das últimas
décadas, que atribuíam à gordura saturada e ao colesterol contidos
nesses alimentos o alto risco de desenvolver doença cardiovascular.
Fonte:abc da saúde
Nenhum comentário:
Postar um comentário