segunda-feira, 26 de outubro de 2015

A biologia dos gêmeos

 
 A biologia dos gêmeos
           
A biologia dos gêmeos Gêmeos no útero, magnífica imagem de 1754 do cirurgião William Smellie (1697-1763). Imagem: Wikimedia Commons.
 
Gêmeos são crianças nascidas no mesmo parto, ou seja, da mesma mãe e geralmente no mesmo dia. Formalmente eles podem ser de dois tipos:

• Gêmeos monozigóticos, também chamados de idênticos ou univitelinos, são produto da fertilização de um único óvulo, com posterior divisão do zigoto. Esses gêmeos são sempre do mesmo sexo e, de maneira geral, muito parecidos, chegando ao ponto de serem indistinguíveis. Eles têm genomas iguais.

• Gêmeos dizigóticos, também chamados fraternos ou bivitelinos, são produto da fertilização de dois óvulos diferentes no mesmo ciclo ovariano. Esses gêmeos podem ser do mesmo sexo ou de sexos diferentes e são tão parecidos quanto dois irmãos quaisquer. Geneticamente eles têm em média 50% de compartilhamento genômico.

A humanidade sempre teve enorme fascínio pelos gêmeos, tecendo histórias mitológicas nas quais eles aparecem como conectados de forma especial, parceiros, metades de um todo que se completa, ou até opostos e antagônicos. Eles são paradigmas tanto do igual como do diferente.

Por exemplo, no mito de criação do Egito antigo, o deus da terra Geb e a deusa dos céus Nut eram gêmeos, e também amantes, em eterno abraço. Da união deles nasceram Ísis e Osíris, os mais populares deuses egípcios.

Um mito semelhante aparece na saga dos Volsung da mitologia nórdica, magistralmente contada por Richard Wagner (1813-1883) em sua ópera As Valquírias, parte de O anel dos Nibelungos (curiosamente uma trilogia de quatro óperas, já que a primeira, O ouro do Reno, é, formalmente, um prelúdio apenas). Sigmundo e Sieglinda são irmãos gêmeos que, sem saber disso, tornam-se amantes e geram Siegfried, que irá, ultimamente, por meio de sua relação amorosa com Brunhilda, causar o crepúsculo dos deuses e a ruína do palácio de Valhala. E é exatamente a destruição dos deuses que vai permitir a emergência dos humanos como a força dominante na Terra – uma bela lenda humanista.
Linda imagem da constelação Gemini do atlas celeste Uranographia, desenhado em 1690 por Johannes Hevelius (1611-1687). Imagem: Wikimedia Commons.
Muitos outros pares de gêmeos aparecem na mitologia e conquistam o imaginário popular. Entre eles, podemos destacar Castor e Pólux, lendários personagens gregos, atualmente as estrelas mais brilhantes da constelação de gêmeos (Gemini), um dos doze signos do zodíaco (de 21 de maio a 21 de junho), e também Rômulo e Remo, fundadores de Roma.

Literariamente, inúmeras estórias abordam os gêmeos, sendo comum o tema das confusões geradas pela semelhança fisionômica entre eles. William Shakespeare (1564-1616) conseguiu colocar duas duplas de gêmeos idênticos em uma única peça, apropriadamente chamada A comédia dos erros.

Distinguindo os tipos de gêmeos
A frequência do nascimento de gêmeos varia consideravelmente em diferentes populações: vai de cerca de 1% dos nascimentos nos países europeus a mais de 4% na Nigéria. A explicação para essa diferença apareceu após a invenção de uma simples maneira de calcular qual proporção dos gêmeos é monozigótica e qual é dizigótica.

O chamado Método de Weinberg baseia-se no fato de que gêmeos dizigóticos são metade das vezes de sexos diferentes e metade de sexo igual. Assim, a frequência de gêmeos monozigóticos pode ser estimada diminuindo-se do total o dobro do número de gêmeos de sexos diferentes. Quando isso foi feito, constatou-se algo muito interessante: a proporção de gêmeos idênticos é mais ou menos uniforme em todos os continentes e países (cerca de 0,4%), enquanto o que varia é a magnitude dos gêmeos fraternos. Na coluna do mês que vem entrarei em mais detalhes sobre o significado dessa observação.

Alguns leitores podem indagar se é possível usar o exame da(s) placenta(s) e das membranas fetais para estabelecer a zigosidade de gêmeos. Sabemos que o feto humano, que está ligado ao útero pela placenta, é envolvido por uma membrana amniótica (âmnio), que, por sua vez, é circundada por outra membrana chamada cório. Após o nascimento, todas essas estruturas são expulsas do útero e podem ser estudadas.

Inevitavelmente, todos os gêmeos dizigóticos terão dois âmnios e dois córios. Mas os gêmeos monozigóticos terão somente um âmnio e um cório? Não. Se há apenas um âmnio e um cório (gravidez monoamniótica e monocoriônica) podemos ter certeza que os gêmeos são monozigóticos, mas isso só é visto em cerca de 5% dos casos.

De maneira geral, se a separação e implantação dos gêmeos idênticos é mais tardia, podemos ter dois âmnios e um cório (52%) ou dois âmnios e dois córios (43%). Assim, o estabelecimento do número de córios é de muito pouca valia. Além disso, a análise de membranas é complexa, pois frequentemente elas se colam uma na outra e podem parecer uma só. A análise do número de placentas é igualmente pouco útil, pois é comum gêmeos fraternos terem uma única placenta.
 
 


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