sábado, 7 de setembro de 2013

Combinações do baralho

Existem mais combinações em um baralho de cartas ou estrelas no universo?

Por  em 5.09.2013 as 10:36
baralho
Parece exagero, mas não é: há mais arranjos possíveis de cartas de baralho do que estrelas no universo conhecido. O número completo é 52! (ou 52 fatorial, lembra-se dele?), que é algo aproximadamente como um 8 seguido por 67 zeros. É uma quantidade muito maior do que o número de segundos que se passaram desde que o universo começou, aliás.
O baralho padrão de 52 cartas foi inventado há cerca de 500 anos. Outro fato bastante impressionante é que há tantos mecanismos possíveis envolvendo as cartas que é estatisticamente improvável que quaisquer dois maços de baralho tenham se repetido em toda a história. Há, de fato, 80.658.175.170.943.878.571.660.636.856.403.766.975.289.505.440.883.277.824.000.000.000.000 (ou 10 elevado à sexagésima oitava potência: 10⁶⁸) arranjos possíveis.
O número acima, impossível de ser processado pelo seu cérebro de qualquer maneira convencional, corresponde ao 52 fatorial e representa as possíveis ordens de um baralho embaralhado. Embora grande, o cálculo para se chegar a esse número é bastante simples. Você pode até se lembrar dela dos seus tempos de colégio: trata-se da análise combinatória.
Para que dois maços de baralho apresentem exatamente a mesma ordem, as 52 cartas de cada baralho precisam estar na mesmíssima posição que as cartas do outro baralho. Ou seja, temos 52 possibilidades na primeira posição, a carta de cima. Para o segundo posto, restam 51 concorrentes. Na sequência, 50, e assim sucessivamente.
A conta é feita multiplicando todas essas possibilidades, do 52 até o 1 (52 x 51 x 50 …). Como resultados, temos o assombroso número de 8 seguido de 67 zeros. Concluindo, há mais arranjos possíveis dessas cartas do que átomos existentes no planeta Terra.
Com uma gama tão surpreendente de probabilidades, a ciência da “contagem de cartas”, ou prever qual será a próxima carta a surgir de um baralho, parece mais mágica do que matemática. Há, no entanto, fórmulas conhecidas para derrubar as probabilidades em favor de um jogador. Em cassinos dos Estados Unidos, a contagem de cartas não é ilegal, apesar de as casas o desaprovarem veementemente, além de empregarem várias medidas preventivas para evitar que os jogadores profissionais causem prejuízos aos cassinos.
O fato é que não importa quão bom jogador de cartas que você é, você provavelmente nunca irá embaralhar suas cartas o suficiente, pelo menos de acordo com os matemáticos Persi Diaconis, da Universidade de Harvard, e David Bayer da Universidade de Columbia, ambas nos Estados Unidos.

A matemática do embaralhamento

Em um famoso estudo de décadas atrás, os pesquisadores anunciaram que matematicamente se leva pelo menos sete embaralhadas para misturar um baralho de 52 cartas, e que se você o fizer mais de 7 vezes, não fará muita diferença.
Bayer e Diaconis escolheram uma abordagem incomum: fizeram muito trabalho de campo. Eles jogaram cartas. Eles assombraram cassinos. Eles até gravaram maços de baralhos sendo embaralhados e analisaram o som para ver como as cartas eram intercaladas. No final, a dupla encontrou uma maneira mais simples de medir a aleatoriedade de um baralho.
Como até mesmo um amador sabe, você pode dizer um maço foi completamente embaralhado quando uma determinada sequência de cartas acaba nas mãos de um jogador só. Para transformar essa intuição em uma medida geral de aleatoriedade, Diaconis e Bayer definiram algo chamado de “sequência crescente”.
Eles contaram as cartas do baralho de 1 a 52, sem levar em conta os naipes, e começaram as suposições. Se a pilha for cortada uniformemente em outras duas, um maço vai conter cartas numeradas de 1 a 26 e a outra, as demais cartas, de 27 a 52. Após embaralhar os montes, teremos uma sequência parecida com essa: 1, 27, 2, 28, 3, 29 etc.
Esse baralho mexido possui duas sequências crescentes de números intercaladas: 1, 2, 3 e 27, 28, 29. Após cada embaralhada, o número de sequências crescentes aumenta, mas elas se tornam mais curtas. Um baralho tido como completamente embaralhado possui 26 sequências crescentes e nenhum vestígio da ordem original.

O poder do 7

E quantas mexidas são necessárias para se conseguir isso? Depois de assistirem a inúmeros jogos de cartas, Diaconis e Bayer se convenceram de que 7 é o “número mágico”. Após muita observação, eles desenvolveram uma fórmula para calcular a probabilidade de que um determinado número de embaralhadas iria produzir um determinado número de sequências crescentes.
A fórmula prevê que 7 mexidas geram cerca  de 26 sequências. Em outras palavras, 7 embaralhadas são suficientes para randomizar o maço. “Guiados por nossos cálculos, soubemos que essa era a resposta certa”, contou Diaconis. “Ou seja, nós esperávamos que soubéssemos a resposta. A matemática quase sempre tem uma maneira de surpreender você”.

A prova real

Os pesquisadores ainda tinham que provar que sua fórmula estava correta ao realizar a prova real. E ela veio de uma forma inusitada: a dupla inovou ao criar a descrição geométrica do ato de embaralhar. “Aí nós tivemos um avanço real”, lembrou. “Não era apenas uma questão de usar computadores maiores. Descobrimos uma forma completamente nova de olhar para o problema”.
O novo método é abstrato, mas visual: ele usa um hipercubo dimensional para representar todos os arranjos possíveis de um baralho de 52 cartas. Um ponto dentro do hipercubo representa o estado atual do maço. Cada eixo corresponde a uma carta, e a posição do ponto ao longo do eixo corresponde à posição da carta no baralho – quanto mais longe se vai ao longo do eixo mais perto a carta está da parte superior da pilha. Ao registrar as 52 coordenadas de um ponto de acordo com sua magnitude, você vai ter escrito a sequência das cartas.
Cada uma das possíveis sequências de 10⁶⁸ é representada no hipercubo por um “elemento de volume”, dentro do qual as coordenadas não mudam. É realmente difícil imaginar isso, mas as coisas ficam mais fáceis se você visualizar essa figura em três dimensões, isto é, como se fosse o caso de um baralho de três cartas.
Nesse caso, o hipercubo vira um cubo comum com três eixos (x , y e z). Os elementos de volume são seis tetraedros que têm em comum a diagonal que corta o cubo a partir do ponto de origem. Dentro de cada tetraedro, as três coordenadas – por exemplo, x é maior que y e y é maior do que z – não mudam. Cada tetraedro corresponde a uma das seis possíveis sequências de três cartas.
O modelo criado pelos pesquisadores com as 52 é, claro, muito mais complexo, mas segue a mesma linha de raciocínio. Graças a esse modelo, eles também foram capazes de estabelecer como a figura se comporta após cada embaralhada e descobrir a probabilidade de as cartas acabarem em um determinado arranjo.
Diaconis declarou na época que estava satisfeito com a reação do público diante da pesquisa. “Geralmente, o máximo que você pode esperar, em matemática, é o reconhecimento relutante de poucas pessoas que entendem sobre o que você está falando. Mas embaralhar cartas parece ter capturado a atenção das pessoas”.

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